I – INTRODUÇÃO
Neste mundo hodierno, os temas apresentados pelos
autores contemporâneos demonstram seu caráter engajado na vida
sócio-político-cultural. A retratação da realidade empírica versus a conotação do imaginário
fictício torna a literatura um vasto campo de conjunturas inter e
intrapsíquicas, onde o autor libera suas visões de mundo, da vida e do próprio
homem; e o leitor participa interagindo através da composição de seu co-texto a
partir das conexões contextuais e intertextuais, criando, assim, uma gama de
ressignificações.
A
sociedade atual, em qualquer país, está dividida em duas frentes: a que possui
e detém o poder; e a que não possui e é dominada, ou seja, a grande maioria da
população, haja vista que a concentração de renda está nas mãos de poucos, ou
melhor, da classe dominante. Este contexto sócio-político é transposto para a
literatura através da dialética do Mesmo
e do Outro, onde o Mesmo representa a pequena elite
dominante composta de políticos e empresários e o Outro a grande classe dos trabalhadores, profissionais liberais e
autônomos.
Os
autores, geralmente, se enquadram em um movimento literário ao apresentar
características semelhantes no mesmo período histórico-cultural, contudo
possuem traços distintos que os caracterizam individualmente. Assim, postula-se
uma nova linha na análise literária, a saber, os pólos antitéticos da Diferença e Semelhança.
Outra
linha de análise crítica constitui a dupla realidade: objetiva versus
subjetiva. A Realidade Objetiva ou
empírica projeta-se através das experiências concretamente vivenciadas pelos
seres vivos, enquanto a Realidade
Subjetiva instaura-se no pensamento e desejo tanto coletivo quanto
individual.
O corpus deste estudo, o texto “Clínica de
Repouso” de Dalton Trevisan, será analisado através destas linhas de pesquisa
mencionada acima, porém considerando os seguintes parâmetros: o eixo axiológico
da nacionalidade, universalidade e atualidade; o anti-maniqueísmo; o leitor
participante; o autor engajado; e o paradoxo.
Este
trabalho tenciona observar, identificar e dissertar sobre: as diferenças e
semelhanças do autor em relação ao movimento literário a que pertence; o
contexto do dominador e dominado, ou seja, do Mesmo e Outro. Também se
verificará o comprometimento social do autor e a participação efetiva do leitor
de hoje através da intensa relação entre autor-obra-leitor.
II
- Vida e Obra de Dalton Trevisan
Nascido em 14 de junho de 1925, o curitibano Dalton
Jérson Trevisan sempre foi enigmático. Antes de chegar ao grande público, quando
ainda era estudante de Direito, costumava lançar seus contos em modestíssimos
folhetos. Em 1945 estreou-se com um livro de qualidade incomum, Serenata ao
Luar, e, no ano seguinte, publicou Sete Anos de Pastor. Dalton renega os dois.
Declara não possuir um exemplar sequer dos livros e "felizmente já esqueci
aquela barbaridade".
Entre
1946 e 1948, editou a revista Joaquim, "uma homenagem a todos os Joaquins
do Brasil". A publicação tornou-se porta-voz de uma geração de escritores,
críticos e poetas nacionais. Reunia ensaios assinados por Antonio Cândido,
Mario de Andrade e Otto Maria Carpeaux e poemas até então inéditos, como O caso
do vestido, de Carlos Drummond de Andrade. Além disso, trazia traduções
originais de Joyce, Proust, Kafka, Sartre e Gide e era ilustrada por artistas
como Poty, Di Cavalcanti e Heitor dos Prazeres.
Já
nessa época, Trevisan era avesso a fotografias e jamais dava entrevistas. Em
1959, lançou o livro Novelas Nada Exemplares - que reunia uma produção de duas
décadas e recebeu o Prêmio Jabuti da Câmara Brasileira do Livro - e conquistou
o grande público. Acresce informar que o escritor, arisco, águia, esquivo, não
foi buscar o prêmio, enviando representante. Escreveu, entre outros, Cemitério
de elefantes, também ganhador do Jabuti e do Prêmio Fernando Chinaglia, da
União Brasileira dos Escritores, Noites de Amor em Granada e Morte na praça,
que recebeu o Prêmio Luís Cláudio de Sousa, do Pen Club do Brasil. Guerra
conjugal, um de seus livros, foi transformado em filme em 1975. Suas obras
foram traduzidas para diversos idiomas: espanhol, inglês, alemão, italiano,
polonês e sueco.
Dedicando-se
exclusivamente ao conto (só teve um romance publicado: A Polaquinha), Dalton
Trevisan acabou se tornando o maior mestre brasileiro no gênero. Em 1996,
recebeu o Prêmio Ministério da Cultura de Literatura pelo conjunto de sua obra.
Mas Trevisan continua recusando a fama. Cria uma atmosfera de suspense em torno
de seu nome que o transforma num enigmático personagem. Não cede o número do
telefone, assina apenas "D. Trevis" e não recebe visitas — nem mesmo
de artistas consagrados. Enclausura-se em casa de tal forma que mereceu o
apelido de O Vampiro de Curitiba, título de um de seus livros.
"O
"Nélsinho" dos contos originalíssimos e antológicos, é considerado
desde há muito "o maior contista
moderno do Brasil por três quartos da melhor crítica atuante".
Incorrigível arredio, há bem mais de 35 anos, com com um prestígio incomum nas
maiores capitais do País. Trabalhador
incansável, fidelíssimo ao conto, elabora até a exaustão e a economia mais
absoluta, formiguinha, chuvinha renitente e criadeira, a ponto de chegar ao
tamanho do haicai, Dalton Trevisan insiste ontem, hoje, em Curitiba e
trabalhando sobre as gentes curitibanas ("curitibocas", vergasta-as com
chibata impiedosa) e prossegue, com independência solene e temperamento
singular, na construção e dissecação da supra-realidade de luas, crianças,
amantes, velhos, cachorros e vampiros. E polaquinhas, deveras."
Em
2003, divide com Bernardo Carvalho o maior prêmio literário do país — o 1º
Prêmio Portugal Telecom de Literatura Brasileira — com o livro "Pico na Veia".
Livros Publicados:
Abismo de Rosas ; Ah,
É?; A Faca No Coração; A Guerra Conjugal; A Polaquinha; A Trombeta do Anjo Vingador; Cemitério
de Elefantes; Chorinho Brejeiro; Contos Eróticos; Crimes de Paixão; Desastres
do Amor; 234; Dinorá - Novos Mistérios; Em
Busca da Curitiba Perdida; Essas Malditas Mulheres; Lincha Tarado; Meu Querido
Assassino; Morte na Praça; Mistérios de Curitiba; Noites de Amor em
Granada; Novelas nada Exemplares; O
Pássaro de Cinco Asas; O Rei da Terra; O Vampiro de Curitiba; Pão e Sangue;
Primeiro Livro de Contos; Vinte Contos Menores; Virgem Louca, Loucos Beijos; Vozes do Retrato - Quinze Histórias - Mentiras
e Verdades; Quem tem medo de vampiro?; 77Ais;
111 Ais; Pico na veia
(todos
os livros publicados pela Editora Record - São Paulo, exceto "Vozes do
Retrato - Quinze Histórias - Mentiras e Verdades" e "Quem tem medo de
vampiro?", publicados pela Editora Ática - São Paulo, "77 Ais",
impresso pelo autor em papel jornal, e "111 Ais", L&PM - Porto
Alegre).
Livros renegados pelo autor:
-
Serenata ao Luar
- Sete
Anos de Pastor
(Primeiros
livros publicados, que o autor renega. Editores desconhecidos).
No Exterior:
- Novela Nada
Ejemplares - trad. Juan Garcia Gayo, Monte Avila - Caracas
- The Vampire of Curitiba and Others Stories - trad. Gregory Rabassa,
Alfred A. Knopf, Nova Iorque
- De Koning Der
Aarde (O Rei da Terra) - trad. August Willemsen, Amsterdam
- El Vampiro de
Curitiba - trad. Haydée M.J.Barroso, Ed.Sudamericana - Buenos Aires
- De
Vijfvleugelige Voguel (O Pássaro de Cinco Asas) - trad. A. Willemsen, Amsterdam
Antologias:
-
Contos em antologias alemãs (1967 e 1968), argentinas (1972 e 1978), americanas
(1976 e 1977), polonesas (1976 e 1977), sueca (1963), venezuelana (1969),
dinamarquesa (1972) e portuguesa (1972).
Filmes:
- A
Guerra Conjugal - histórias e diálogos do autor, roteiro e direção de Joaquim
Pedro de Andrade, 1975.
Informações
obtidas junto à página da Editora Record e artigos publicados pelo jornal
"O Estado de São Paulo", de autoria de José Paulo Paes e João
Antônio, em 20-07-96.
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