sábado, 9 de março de 2013


Carlos Drummond de Andrade (1902-1987)

DADOS BIOGRÁFICOS

Carlos Drummond de Andrade nasceu em Itabira, Minas Gerais em 1902. Após estudos em sua terra natal e Belo Horizonte, foi interno no Colégio Anchieta, em Friburgo, em 1918. No ano seguinte, foi expulso devido a um incidente com o professor de português. Em Itabira, apesar de formado em farmácia, vivia das aulas de português e geografia. Tornou-se funcionário público em 1929, e, em 1934, o cargo no Ministério da Educação transferiu-o para o Rio de Janeiro. Em 1945, foi co-editor do jornal comunista Tribuna Popular a convite de Luís Carlos Prestes. A partir da década de 50, dedicou-se apenas à literatura, escrevendo novos livros de poesias e contos. Além de intensificar a produção de crônicas, fez também traduções. Carlos Drummond morreu no Rio de Janeiro em 1987.

CARACTERÍSTICAS LITERÁRIAS

Carlos Drummond de Andrade é o primeiro grande poeta pós-movimento modernista e um dos mais importantes poetas brasileiros. Seu livro Alguma Poesia de 1930 marca o início da segunda fase poética do Modernismo.

Escreveu também prosa que se caracteriza pela riqueza e expressividade da linguagem e do tema, impregnados de senso de humor. Atribuem-se essas qualidades, igualmente, à sua obra poética. Segundo Bosi, Drummond possui uma percepção precisa do hiato entre as convenções e a realidade, entre o parecer e o ser das coisas e dos indivíduos, o que se transforma em objeto privilegiado do humor, seu traço principal. O conjunto de sua obra poética é complexo e vasto, do qual, pela freqüência, é possível destacar certas características e tendências [ver Antologia].

Num primeiro momento, sem se deixar envolver, o poeta mantém um certo distanciamento do mundo à sua volta, o que lhe possibilita brincar e soltar a razão, deixando-a entregue a si mesma, maquinando incertezas e certezas, mais afeitas a negar e anular que a construir. Daí os temas do cotidiano, da família, do isolamento, da monotonia entendiante das coisas e do viver, expressos numa linguagem coloquial plena de ironia seca, sarcasmo e humor desencantado, onde sentimento e emoção são refreados. São deste primeiro momento os livros Alguma Poesia e Brejo das Almas.

No segundo momento, sem se distanciar, deixa-se envolver pela realidade à sua volta e canta a impotência e a solidão em um mundo mecânico, frio e político; a decepção e a falta de perspectiva diante da fragmentação causada pela guerra; o sofrimento e a solidariedade do ser humano brasileiro e universal. Temas estes abordados em tons ora esperançosos, ora desesperançosos, com a mesma ironia, humor e sobriedade, estão presentes nos livros Sentimento do Mundo, José e A Rosa do Povo.

Finalmente, o poeta busca o real, através de interrogações e negações que lhe revelam o vazio, o nada e o desencanto que sempre acompanham o homem. Da poesia metafísica de Claro Enigma, desse período, Drummond passa à poesia objectual de Lição de Coisas que, ao enfatizar a linguagem nominal e os aspectos visuais e sonoros, valoriza objetos e coisas, violando e desintegrando a palavra.

PRINCIPAIS OBRAS

Poesia

Alguma Poesia (1930); Brejo das Almas (1934); Sentimento do Mundo (1940); José (1941) Poesias (1942); A Rosa do Povo (1945); Poesia Até Agora (1948); A mesa (1951); Claro Enigma (1951); Viola de Bolso I (1952); Fazendeiro do Ar e Poesia Até Agora (1955);

Viola de Bolso II (1955); Soneto da Buquinagem (1955); 50 Poemas Escolhidos pelo Autor (1956); Ciclo (1957); Poemas (1959); Lição de Coisas (1962); Antologia Poética (1963); José & Outros (1967); Boitempo & a Falta que Ama (1968); Reunião (10 livros de poesia) (1969); Menino Antigo (1973); As Impurezas do Branco (1973).

Contos

Contos de Aprendiz (1951).

Crônicas

Confissões de Minas (1944); O Gerente (1945); Passeios na Ilha (1952); Fala, Amendoeira (1957); A Bolsa e a Vida (1962); Cadeira de Balanço (1966); Versiprosa (1967); Uma Pedra no Meio do Caminho - Biografia de um Poema (1967); Caminhos de João Brandão (1970); Os Dias Lindos (1977).

Traduções

Uma Gota de Veneno (Therèse Desqueyroux), de François Mauriac (1943); As Relações Perigosas, de Choderlos de Laclos (1947); Os Camponeses, de Honoré de Balzac. A Comédia Humana, v. XIII (1954); A Fugitiva (Albertine Disparue), Marcel Proust (1956); Dona Rosita, a Solteira, de Federico Garcia Lorca (1959); Beija-Flores do Brasil, de Th.Descourtilz (1960); O Pássaro Azul, de Maurice Maeterlink (1962); Artimanhas de Scarpino, de Molière (1962); Fome, de Knut Hamsum (1963).


 
POEMA DE SETE FACES

Quando nasci, um anjo torto

desses que vivem na sombra

disse: Vai, Carlos! ser gauche na vida.

As casas espiam os homens

que correm atrás de mulheres.

A tarde talvez fosse azul,

não houvesse tantos desejos.

O bonde passa cheio de pernas:

pernas brancas pretas amarelas.

Para que tanta perna, meu Deus, pergunta meu coração.

Porém meus olhos

não perguntam nada.

O homem atrás do bigode

é sério, simples e forte.

Quase não conversa.

Tem poucos, raros amigos

o homem atrás dos óculos e do bigode.

Meu Deus, por que me abandonaste

se sabias que eu não era Deus

se sabias que eu era fraco.

Mundo mundo vasto mundo,

se eu me chamasse Raimundo

seria uma rima, não seria uma solução.

Mundo mundo vasto mundo,

mais vasto é meu coração.

Eu não devia te dizer

mas essa lua

mas esse conhaque

botam a gente comovido como o diabo.




DRUMMOND DE ANDRADE, Carlos. Obra Completa. 2a Ed. Rio de Janeiro: José Aguilar Editora, 1967. p. 53.

 

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