Aluísio
Azevedo
Aluísio Tancredo Belo
Gonçalves de Azevedo, caricaturista, jornalista, romancista e diplomata, nasceu
em São Luís, MA, em 14 de abril de 1857, e faleceu em Buenos Aires, Argentina,
em 21 de janeiro de 1913. É o fundador da Cadeira n. 4 da Academia Brasileira
de Letras.
Era filho do vice-cônsul
português David Gonçalves de Azevedo e de d. Emília Amália Pinto de Magalhães e
irmão mais moço do comediógrafo Artur Azevedo. Sua mãe havia casado, aos 17
anos, com um rico e ríspido comerciante português. O temperamento brutal do
marido determinou o fim do casamento. Emília refugiou-se em casa de amigos, até
conhecer o vice-cônsul de Portugal, o jovem viúvo David. Os dois passaram a
viver juntos, sem contraírem segundas núpcias, o que à época foi considerado um
escândalo na sociedade maranhense.
Da infância à adolescência,
Aluísio estudou em São Luís e trabalhou como caixeiro e guarda-livros. Desde
cedo revelou grande interesse pelo desenho e pela pintura, o que certamente o
auxiliou na aquisição da técnica que empregará mais tarde ao caracterizar os
personagens de seus romances. Em 1876, embarcou para o Rio de Janeiro, onde já
se encontrava o irmão mais velho, Artur. Matriculou-se na Imperial Academia de
Belas Artes, hoje Escola Nacional de Belas Artes. Para manter-se, fazia
caricaturas para os jornais da época, como O Figaro, O Mequetrefe, Zig-Zag e A
Semana Ilustrada. A partir desses “bonecos” que conservava sobre a mesa de
trabalho, escrevia cenas de romances.
A morte do pai, em 1878,
obrigou-o a voltar a São Luís, para tomar conta da família. Ali começou a
carreira de escritor, com a publicação, em 1879, do romance Uma lágrima de
mulher, típico dramalhão romântico. Ajuda a lançar e colabora com o jornal
anticlerical O Pensador, que defendia a abolição da escravatura, enquanto os
padres mostravam-se contrários a ela. Em 1881, Aluísio lança O mulato, romance
que causou escândalo entre a sociedade maranhense, não só pela crua linguagem
naturalista, mas sobretudo pelo assunto de que tratava: o preconceito racial. O
romance teve grande sucesso, foi bem recebido na Corte como exemplo de
Naturalismo, e Aluísio pôde fazer o caminho de volta para o Rio de Janeiro,
embarcando em 7 de setembro de 1881, decidido a ganhar a vida como escritor.
Quase todos os jornais da
época tinham folhetins, e foi num deles que Aluísio passou a publicar seus
romances. A princípio, eram obras menores, escritas apenas para garantir a
sobrevivência. Depois, surgiu nova preocupação no universo de Aluísio: a
observação e análise dos agrupamentos humanos, a degradação das casas de pensão
e sua exploração pelo imigrante, principalmente o português. Dessa preocupação
resultariam duas de suas melhores obras: Casa de pensão (1884) e O cortiço
(1890). De 1882 a 1895 escreveu sem interrupção romances, contos e crônicas,
além de peças de teatro em colaboração com Artur de Azevedo e Emílio Rouède.
Em 1895 encerrou a carreira
de romancista e ingressou na diplomacia. O primeiro posto foi em Vigo, na
Espanha. Depois serviu no Japão, na Argentina, na Inglaterra e na Itália.
Passara a viver em companhia de D. Pastora Luquez, de nacionalidade argentina,
junto com os dois filhos, Pastor e Zulema, que Aluísio adotou. Em 1910, foi
nomeado cônsul de 1a classe, sendo removido para Assunção. Depois foi para
Buenos Aires, seu último posto. Ali faleceu, aos 56 anos. Foi enterrado naquela
cidade. Seis anos depois, por uma iniciativa de Coelho Neto, a urna funerária
de Aluísio Azevedo chegou a São Luís, onde o escritor foi sepultado
definitivamente. Obras: Uma lágrima de mulher, romance
de estréia (1880); O mulato, romance
(1881); Mistério da Tijuca, romance (1882;
reeditado: Girândola de amores); Memórias de um
condenado (1882; reeditado: A condessa Vésper); Casa
de pensão, romance (1884); Filomena Borges,
romance (publicado em folhetins na Gazeta de Notícias, 1884); O homem, romance (1887); O
coruja, romance (1890); O cortiço,
romance (1890); Demônios, contos (1895); A mortalha de Alzira, romance (1894); Livro de uma sogra, romance (1895).
Casa
de Pensão - Aluísio Azevedo
Amâncio de Vasconcelos, um
jovem maranhense, vem para o Rio de Janeiro, com o propósito de realizar o
curso de Medicina. De início hospeda-se em casa de um conhecido da família,
Luís Campos, que vivia com sua mulher Dona Maria Hortência e uma cunhada, Dona
Cadotinha. Entretanto, Amâncio encontrara-se! com um amigo e co-provinciano,
Paiva Rocha, e passa a viver uma vida desvairada e boêmia. As extravagâncias de
chegar altas horas da noite, faltar às aulas, embebedar-se, não lhe eram
permitidas em casa de Campos. Por outro lado, o jovem estudante começara a
despertar um certo interesse no coração de Hortência. Levado por esses motivos,
resolve ele mudar-se para a pensão de João Coqueiro, que lhe fora apresentado
por Paiva Rocha. Acaba envolvido por Amélia, irmã de João Coqueiro, que finge
ignorar o romance e explora-a, exigindo dinheiro do rapaz (Amâncio). Enredado
no ambiente asfixiante e corrupto da pensão de João Coqueiro e de Mme. Brizard,
sua mulher, envolvido em uma série de tramas, Amâncio resolve viajar para São
Luís, para rever a mãe, agora viúva. João Coqueiro suspeita da viagem, e
consegue que a polícia prenda Amâncio sob acusação de defloramento, da qual o
estudante é absolvido, em rumoroso julgamento. Inconformado com a absolvição,
João Coqueiro assassina Amâncio com um tiro.
Observações Importantes
Casa de Pensão é uma espécie
de narrativa intermediária entre o romance de personagem (O Mulato) e o romance
de espaço (O Cortiço). Como em O Mulato, todas as ações ainda estão vinculadas
à trajetória do herói, nesse caso, Amâncio de Vasconcelos. Mas, como em O
Cortiço, a conquista, ordenação e manutenção de um espaço é que impulsiona,
motiva e ordena a ação. Espaço e personagem lutam, lado a lado, para evitar a
degradação.
O romance foi inspirado em
um caso verídico, a Questão Capistrano, crime que sensibilizou o Rio de Janeiro
em 1876/77, envolvendo dois estudantes, em situação muito próxima à da narração
de Aluísio Azevedo.
As teses naturalistas,
especialmente o Determinismo, alicerçam a construção das personagens e das
tramas.
No texto que transcrevemos a
seguir, Aluísio Azevedo, ao descrever a formação de Amâncio Vasconcelos, mostra
os fatores que determinaram o seu comportamento e o seu destino: a educação
severa do pai e do mestre-escola, a superproteção da mãe, a sífilis contraída
da ama-de-leite, que são as geratrizes de uma personalidade reprimida e
hipócrita:
"... esses pequenos
episódios de infância, tão insignificântes na aparência, decretaram a diluição
que devia tomar o caráter de Amâncio. Desde logo habituou-se a fazer uma falsa
idéia de seus semelhantes; julgou os homens por seu pai, seu professor e seus
condiscípulos. - E abominou-os. Principiou a aborrecê-los secretamente, por uma
fatalidade do ressentimento, principiou a desconfiar de todos, a prevenir-se
contra tudo, a disfarçar, a fingir que era o que exigiam brutalmente que ele
fosse. "
Inseguro, necessitado de
proteção materna, Amâncio procura na pensão carioca o substitutivo da família,
incapaz de perceber as ciladas que lhe são armadas pela proprietária, Mme.
Brizard e pela sensual Amélia. O dinheiro é a mola dessa sociedade corrupta e
hipócrita. Observe o cinismo dos pensamentos de João Coqueiro, refletindo sobre
o comportamento que sua irmã, Amélia, deveria simular, para envolver Amâncio:
"Amélia, desde que se
convertesse numa necessidade para a vida de Amâncio, este, com certeza, seria o
mais interessado em fazer dela sua esposa; por conseguinte, agora o que
convinha era que a rapariga também ajudasse de sua parte, empregando todo o
jeito e boa vontade de que pudesse dispor.- devia mostrar-se cordata, simples
nos seus gostos, bem arranjadinha, amiga do asseio, honesta, digna, enfim, de
um marido!"
Nenhum comentário:
Postar um comentário